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Data da publicação: 30/11/2016

Esta entrevista foi originalmente publicada na revista ICMCotidi@no nº 97, edição de Abril/Maio/Junho de 2012.

 

 

O professor Gilberto Francisco Loibel deu grande contribuição para a consolidação da pesquisa em matemática no Brasil. Ele é um dos pioneiros do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, tendo participação ativa em sua criação em 1971, a partir do então Departamento de Matemática da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC).

Nascido em 24 de maio de 1932, na cidade de São Paulo, realizou os estudos primários e parte do secundário na Alemanha. De volta ao Brasil, obteve o título de Licenciado e Bacharel em Matemática pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP no ano de 1955 e lá começou como instrutor no ano seguinte. Em 1959, defendeu pela EESC sua tese de doutorado, intitulada Sobre quase grupos topológicos e espaços com multiplicação, orientada pelo professor Achille Bassi. Fez pós-doutorado na Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA), entre 1960 e 1962. No período de 1965 a 1966, foi professor visitante na Universidade Central da Venezuela. Entre 1962 a 1965, foi chefe do Departamento de Matemática da EESC, e de 1971 a 1976, coordenou nessa instituição o Programa de Pós-Graduação em Matemática. Tornou-se professor titular do ICMC em 1981, onde foi vice-diretor no período de 1982 a 1986 e se aposentou em 1987.

A partir de 1990, por 15 anos, foi professor colaborador e adjunto no Instituto de Geociências e Ciências Exatas (IGCE), da UNESP de Rio Claro. Foi membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), da Sociedade Brasileira de Matemática (SBM), da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da Academia de Ciências do Estado de São Paulo (ACIESP), e coordenou as primeiras edições da Olimpíada Brasileira de Matemática.

Neste ano, o professor Loibel completa oitenta anos, e nos dias 12 e 13 de junho próximos o ICMC realizará em sua homenagem um Encontro de Topologia e Singularidades. O evento conta com organização conjunta com o IGCE da UNESP. Aproveitando a oportunidade, realizamos no último dia 27 de abril uma entrevista com ele, que transcrevemos a seguir:

 

Como foi o processo de transição do ICMC de um departamento da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) para um instituto autônomo?

Naquela época éramos sufocados dentro da EESC, obviamente pelo fato do importante ser a engenharia. A matemática e a análise numérica ficavam em segundo plano, estavam sufocadas ali dentro. A questão não era somente relacionada às verbas para funcionários e laboratórios, mas também para a biblioteca. Então, a criação do Instituto foi importantíssima para um maior desenvolvimento, quando passamos a conseguir apoio financeiro do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).

 

Houve resistências? Quais as dificuldades?

Não o suficiente para ser sério. Houve muito mais resistência por parte da Poli (Escola Politécnica) para a criação da EESC no interior.

 

 A biblioteca do ICMC é uma das maiores do país nas áreas de Matemática e Ciências da Computação. Como foi o processo de concepção e formação do acervo no início da biblioteca? Quais coleções o senhor considera mais importantes?

O professor Achille Bassi pôs como uma das condições para trabalhar que uma verba fosse destinada à formação de uma boa biblioteca. Naquela época, as exigências eram mais voltadas ao valor do salário de um catedrático em tempo integral. Logo no início do seu trabalho, começou a comprar revistas e livros. O preço desse material na Europa era baixo, pois o continente vivia o período pós-guerra. Sobravam livros e faltava dinheiro. Quanto às importantes coleções, seria difícil citar apenas uma revista ou livro, pois parte do acervo tem importância histórica, com muitos livros do século XVIII e XIX. De qualquer forma, dentre as principais, cito as revistas que faziam as críticas dos trabalhos publicados em matemática: Central Book Mathematic, Jahre Book Mathematik e Mathematical Reviews.

 

O Instituto se formou numa época marcada pela reforma universitária. Como foi a mudança do sistema de cátedras?

Havia coisas boas e outras ruins no sistema de cátedras que, numa analogia simplista, poderia ser comparado ao feudo na Idade Média. O catedrático poderia ser autoritário, mas tinha a obrigação de orientar o estudante. Quando ingressei aqui, tive aulas com o professor Bassi. O jovem que começava a trabalhar tinha uma orientação sobre o trabalho didático. Antigamente cursávamos bacharelado e licenciatura, isso significava oportunidade de uma boa formação didática, embora não tão especializada como a de um doutor. Pouco após um ano de formado, eu corrigia as provas e ele (Bassi) as recorrigia. Atualmente somente se contratam doutores.

 

De onde vieram os primeiros docentes e como era o regime de contratação deles?

O professor Bassi chegou ao Brasil ainda antes da guerra, inclusive teve problemas pelo fato de ser italiano. O professor Cecconi e Ubaldo Richard foram convidados por ele para virem ao país. Os demais professores, chamados de auxiliares de ensino, eram engenheiros formados pela Escola Politécnica. Com exceção de Rubens Lintz, todos trabalhavam em tempo parcial, faziam a parte didática e não se dedicavam à pesquisa.

 

Como suas experiências no exterior contribuíram para sua formação como pesquisador e para as pesquisas no ICMC?

Em Berkeley aprendi as bases da Teoria das Singularidades, que deu origem ao atual grupo de pesquisa. A professora Maria Aparecida Soares Ruas foi minha orientanda.

 

O atual nível de internacionalização dos grupos de pesquisa do ICMC tem raízes históricas?

Sim. As primeiras áreas de pesquisa que se desenvolveram aqui foram a Topologia, que pouco depois passou a incluir também as Singularidades, depois as Equações Diferenciais, liderada pelo professor Nelson Onuchic e a Análise Numérica, liderada pelo professor Odelar Leite Linhares, também ex-docentes do ICMC. O intercâmbio com pesquisadores de outros centros internacionais começou com estes professores pioneiros, e cresceu à medida que se formavam os grupos de pesquisa de maneira orgânica. Por sinal, uma universidade é um organismo vivo.

 

Como o senhor vê o papel atual do ICMC na formação de recursos humanos em matemática no Brasil?

Sem dúvida é uma das instituições mais importantes do país. Houve um tempo em que se fazia uma classificação, e naquele tempo ficávamos em terceiro, atrás do IMPA e do IME. Éramos, portanto, considerados como um dos mais importantes. Posteriormente, foram fundadas outras instituições como a UNICAMP e a UNB. O crescimento da ciência no Brasil foi explosivo e há hoje muitas outras instituições fora do estado de São Paulo. Em 1957, quando foi feita a primeira classificação, São Carlos foi a primeira cidade fora do eixo Rio-São Paulo, e isso prova a importância de São Carlos.

 

Texto e foto: Davi Pastrelo – Assessoria de Comunicação do ICMC

 

 

 

 

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